E o prazo, Francisco?
Em dezembro do ano passado, às vésperas do Natal, o diretor jurídico da J&F, Francisco de Assis, um dos advogados mais poderosos do país, conseguiu uma vitória extraordinária no Supremo Tribunal Federal. Provocado pelo próprio Francisco no mês anterior, o ministro Dias Toffoli suspendeu o pagamento dos cerca de 10,3 bilhões de reais devidos pelo grupo de Joesley e Wesley Batista no acordo de leniência fechado por eles com o Ministério Público Federal.
Mesmo sem provas, e mesmo sem ser o juiz competente para decidir a questão, e, fosse isso pouco, mesmo ignorando que sua esposa advogava para a J&F em outro caso, Toffoli acolheu o argumento dos irmãos Batista, e de Francisco, de que eles foram coagidos pelos procuradores a firmar o acordo, em 2017.
Os Batista penduraram-se nos mesmos autos em que Toffoli havia anulado todas as provas da leniência da Odebrecht - e que, quando relatados por Ricardo Lewandowski nos anos anteriores, ajudaram a salvar Lula, entre outros políticos, no Supremo. Esse processo (uma Reclamação) tinha conexão com a Lava Jato; os irmãos Batista caíram em outra operação, a Greenfield. Filigranas.
Para quem conhece o poder em Brasília, a presença do nome de Francisco na petição inicial da J&F para Toffoli pareceu um recado que não poderia ser ignorado. Esse tipo de petição, mesmo em casos grandes, normalmente é delegada às dezenas de advogados contratados pelo mesmo Francisco, como diretor jurídico do grupo dos Batista. Foi Francisco, por exemplo, que contratou Roberta Rangel, a mulher de Toffoli.
Para quem conhece os acordos de delação do grupo de Batista ao Ministério Público Federal, outro fato causou espanto: Francisco foi, ele mesmo, colaborador premiado. Admitiu crimes, aceitou pagar uma multa de 1,5 milhão de reais e depôs à Procuradoria-Geral da República.
À época da delação, Francisco, assim como os demais executivos da J&F, não parecia agir sob tanta coação assim. Como memória, o leitor pode conferir, ao final deste texto, dois trechos dos depoimentos iniciais do colaborador Francisco à PGR. Abaixo, trecho do acordo firmado com a PGR por Francisco.

O antigo colaborador premiado Francisco, portanto, surge na petição a Toffoli como vítima do "lavajatismo", como ele diz, e, ainda, como advogado da J&F, outra vítima corporativa do mesmo "lavajatismo". Às vezes, as histórias circulares de Brasília parecem saídas de um conto que Borges não teve coragem de escrever.
De fato, não há labirinto mais estranho no Supremo do que os autos dessa Reclamação, iniciada pela defesa de Lula, em que Lewandowski, antes de virar ministro da Justiça no terceiro mandato do mesmo Lula, liberou acesso às mensagens da chamada Operação Spoofing. Nela, a Polícia Federal apreendeu as mensagens roubadas pelo hacker Walter Delgatti de uma conta do então procurador Deltan Dallagnol no Telegram.
Esse material, embora ilícito e não periciado, e contextualizado somente pela defesa de Lula, sem contraditório, foi usado indiretamente para livrar o petista. Dali em diante, um sem número de alvos da Lava Jato obtiveram o mesmo benefício. Em setembro do ano passado, Toffoli declarou imprestáveis todas as provas da Odebrecht.
A maçaroca da Vaza Jato virou argumento para qualquer coisa. Francisco, assim como a Odebrecht, pediu acesso formal ao material da Spoofing. Toffoli concedeu o acesso ainda em dezembro. Em fevereiro, foi a vez da Odebrecht obter o mesmo benefício - a suspensão dos pagamentos de seu acordo e o acesso à Vaza Jato.
A decisão inicial do ministro, contudo, era repleta de lacunas: não indicava sequer o prazo para a análise das mensagens. Em fevereiro, provocado pela AGU e pela CGU, Toffoli disse que esse prazo seria de 60 dias, tanto para a J&F quanto para a Odebrecht. "Para todas as partes", ele disse.
O mafuá processual desse caso é tamanho que a J&F perdeu esse prazo para se manifestar. (A Odebrecht pediu e levou mais tempo; Francisco se posicionou, ainda em março, somente acerca de uma petição da PGR.) Diante desse fato, a Petros, fundo de pensão dos funcionários da Petrobras, que deveria ser ressarcida pela J&F nos termos da leniência, pediu ontem, dia 5, a revogação do benefício concedido por Toffoli em dezembro. E quer que o caso seja levado ao plenário do Supremo.
A Funcef, fundo de pensão dos funcionários da Caixa, que também tem dinheiro a receber da J&F, deve entrar com pedido semelhante nos próximos dias. A Procuradoria-Geral da República já pediu a Toffoli para que o assunto seja levado ao plenário do tribunal - tanto no caso da J&F quanto no caso da Odebrecht. Até agora, foi ignorada pelo ministro.
Entre Francisco, o advogado colaborador, e a PGR, a Petros e a Funcef, ninguém, em Brasília, tem dúvidas de quem irá prevalecer. No prazo que for.
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