Tudo pela grilagem

Brenno Grillo
Publicada em 10/05/2024 às 09:00
Chiquinho (foto) e Domingos Brazão lucravam muito com grilagem, segundo PGR, e Marielle era empecilho ao negócio miliciano. Foto: Pedro Ladeira/Folhapress

A denúncia da Procuradoria-Geral da República contra os irmãos Brazão e outros envolvidos na morte de Marielle Franco e Anderson Gomes mostra o perigo que a vereadora representava para os negócios dos milicianos que lucravam com grilagem. Segundo a PGR, esse foi o motivo que levou ao crime.

O documento assinado pelo vice-PGR, Hindemburgo Chateubriand Filho, complementa o relatório da Polícia Federal que embasou a prisão de todos os envolvidos no crime em março deste ano. Mas Marielle é apenas uma peça do quebra-cabeça que envolve corrupção, milícia e grilarem.

Tudo começou com a CPI das Milícias, capitaneada por Marcelo Freixo, no fim dos anos 2000. Esse foi o estopim da animosidade dos milicianos com o PSOL, pois eles foram expostos pela investigação do então deputado estadual como donos de currais eleitorais mantidos com muita violência e armas de grosso calibre.

Foi Freixo quem detalhou como os Brazão tornavam-se cada vez mais imbatíveis em áreas de milícia. O atual presidente da Embratur também dificultou nomeações de aliados dos irmãos para cargos públicos, como o Tribunal de Contas do Rio de Janeiro, onde Domingos é conselheiro - mesmo estando preso acusado de ser mandante de assassinato e conhecido por suas ligações com milicianos.

Em 2016, Marielle foi eleita vereadora e o problema se agravou. Segundo a PGR, ela passou a apresentar projetos de lei que minavam os interesses dos Brazão, garantindo a posse de terrenos regularizados a pessoas que realmente precisam de moradia. Ela também passou a conscientizar moradores de favelas sobre como eles eram usados para interesses escusos, em detrimento do direito que tinham à moradia.

Isso criou dificuldades, antes inexistentes, para os Brazão aprovarem projetos que flexibilizam normas urbanísticas e ambientais, além do mau uso da Área de Interesse social. Com proteção armada dos milicianos, os irmãos usavam pessoas pobres para invadir áreas não regularizadas e depois aprovar normas na Câmara que garantissem a posse desses terrenos.

Esses lotes eram depois registrados em nome de laranjas, que os vendiam aos Brazão por um preço muito abaixo do valor de mercado. A PGR cita como exemplo um imóvel no Rio registrado em nome de um eletricista e uma doméstica via usucapião.

Metade do terreno de 10 mil metros quadrados foi vendida em agosto 2023 por 110 mil reais à empresa Superplan, pertencente a Domingos Brazão e sua esposa, Alice de Mello Kroff Brazão. O valor real de toda a área, segundo a Prefeitura do Rio, ultrapassa os 7 milhões de reais.

Quando não atuavam diretamente na grilagem, os Brazão usavam integrantes da milícia para fazê-lo. Um deles foi Robson Calixto Fonseca, soldado da PM-RJ conhecido como Peixe e que atua no bairro de Taquara. Documentos obtidos pela Polícia Federal e usados pela PGR mostram o miliciano pedindo orientação a servidores da Prefeitura carioca sobre como regularizar terras invadidas.

Para diversificar os investimentos, os Brazão firmaram parceria com João Bosco Charra, grileiro conhecido no Rio como João do Aterro por ser responsável pela terraplanagem das áreas invadidas em Jacarepaguá. A sociedade do trio firmou foi formalizada na empresa BR Car Veículos.

Jacarepaguá é considerada uma das principais áreas que sofrem com milicianos. Foi lá que os Brazão prometeram um terreno a Ronnie Lessa pelo assassinato de Marielle e do motorista Anderson Gomes.

A região era uma das mais lucrativas para os irmãos, que usavam intermediários para gerir as invasões. Marcelo Penna foi uma dessas pessoas. Ele foi nomeado assessor do gabinete de Domingos na Assembleia Legislativa do Rio e tornou-se advogado da ocupação Vila Taboinhas, organizada pela milícia para conseguir a posse da terra sob falso pretexto.

Penna foi preso em 2009, acusado de grilagem e ligação com milícias. O mesmo motivo levou Ronald Paulo Alves Pereira, miliciano conhecido como major Ronald, para a cadeia 12 anos depois. Este último, junto com Marcus Vinícius (o Fininho) e Laerte Silva de Lima participou do assassinato de Marielle e Anderson.

A relação dos três com os Brazão é antiga, focada na região de Rio das Pedras, e também voltada à grilagem. A proximidade é tamanha que a mãe do filho de Fininho, Kátia Lenise Pereira, foi empregada na Alerj por Domingos. Marcus também fazia a segurança dos Brazão nas favelas durante as campanhas.

Fininho foi quem arrumou a submetralhadora desviada da PF para o assassinato. Laerte espionou Marielle, pois era filiado do PSOL por ordem dos Brazão, e Ronald fez o percurso do trajeto que a então vereadora trilhou no dia de sua morte.

Leia as notícias publicadas pelo Bastidor sobre o caso Marielle e o relatório da PGR:

A milícia do curió

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