Justiça em alta voltagem
Em nova decisão contrária à Agência Nacional de Energia Elétrica e favorável à Âmbar Energia, a juíza Jaiza Maria Pinto Fraxe, da 1ª Vara Federal Cível do Amazonas, atendeu a um pedido da Amazonas Energia para que a Aneel seja obrigada a seguir repassando dinheiro público à distribuidora até que o grupo dos irmãos Batista assuma o controle da empresa.
Mês passado, a juíza Fraxe já havia topado conceder mais dois meses para a Âmbar formalizar o comando da Amazonas Energia. Na decisão mais recente, a juíza também impôs à Companhia de Gás do Amazonas, a Cigás, multa de 4,5 milhões de reais - montante correspondente a 1% do valor total da ação judicial - por má-fé processual.
Fraxe afirmou que a Cigás faltou com a verdade ao informar não ter sido intimada sobre uma decisão anterior, que a havia impedido de participar do processo. A distribuidora de gás afirma em recurso que nunca houve intimação, nos autos do processo, dirigida a seus advogados - e que, por isso, o recurso foi apresentado dentro do prazo de cinco dias após o conhecimento da decisão.
Isoladamente, a decisão da juíza Fraxe parece corriqueira. No contexto da compra da Amazonas Energia pela Âmbar, porém, o ato encaixa-se no mesmo padrão decisório observado desde que ela foi provocada a se manifestar. É a quarta decisão de Fraxe que assegura aos Batista sucesso na operação bilionária de compra da Amazonas Energia, apesar dos protestos de técnicos da Aneel.
Sem as decisões de Fraxe, a Âmbar não estaria à frente - ou prestes a estar à frente - da Amazonas Energia. Desde o início do processo, em junho do ano passado, a magistrada obriga a agência reguladora a aceitar todos os termos propostos pela Âmbar Energia.
A blindagem jurídica concedida por Fraxe fez com que os representantes da companhia da J&F se recusassem a negociar com os diretores da Aneel um caminho que conciliasse as vontades da companhia e o interesse público. A informação foi obtida pelo Bastidor com fontes que participaram das tratativas.
Em 23 de setembro do ano passado, por exemplo, Fraxe deu 48 horas para a Aneel adotar quaisquer "medidas necessárias" para efetivar a aprovação imediata do plano de transferência da Amazonas Energia que foi apresentado pela Âmbar Energia à Justiça. A decisão foi tomada pela juíza seis horas após o processo ter sido liberado para deliberação.
Dez dias após a primeira decisão, Fraxe exigiu que a Aneel chancelasse a compra da Amazonas Energia em 24 horas. No despacho, a juíza não acatou recurso interposto pela agência reguladora, que apontava má-fé da da Amazonas Energia ao judicializar o caso. Ao acionar a Justiça para garantir a concretização da operação, a empresa amazonense apresentou quatro pedidos idênticos a diferentes juízes. Apenas Fraxe deu seguimento ao processo, o que, segundo a Aneel, seria uma forma de burlar o chamado juízo natural do caso.
Em 8 de novembro de 2024, nova decisão de Fraxe reforçou a validade da compra da Amazonas Energia pela Âmbar Energia. A juíza decidiu que o acordo, mesmo assinado fora do prazo previsto pela MP 1.232, que pavimentou a operação, era válido e deveria receber todas as benesses previstas pelo governo. A medida provisória garantia as condições favoráveis ao negócio até 10 de outubro, mas o contrato só foi assinado no dia 11.
Para Fraxe, a perda de prazo foi culpa da Aneel, não da Amazonas Energia, que judicializou o caso, ou da Âmbar Energia, que não quis negociar. Segundo ela, a agência reguladora impôs dificuldades ao negócio porque liberou a documentação para assinatura faltando poucos minutos para a meia-noite.
Em 18 de dezembro, após a Amazonas Energia afirmar que não conseguiria concluir a operação com a Âmbar Energia até o fim de 2024, conforme havia determinado a Aneel, Fraxe garantiu mais 60 dias de salvo-conduto para a concretização da compra. A juíza determinou ainda que a agência reguladora liberasse recursos de um fundo setorial para a Amazonas Energia ter fluxo de caixa suficiente que garantisse a a prestação dos serviços durante este prazo.
O pedido foi atendido por Fraxe após a Amazonas Energia afirmar que o atraso tinha sido causado por "elevados desafios burocráticos" e um dia antes da reunião extraordinária convocada pela Aneel para discutir a situação da distribuidora - a empresa amazonense de energia também havia pedido mais prazo à agência.
Caso o prazo estabelecido pela Aneel fosse cumprido, a Âmbar Energia teria de investir 6,5 bilhões reais na Amazonas Energia no fim de 2024, conforme havia prometido durante as negociações com o Poder Público. Porém, a empresa dos Batista ainda não detalhou de onde virão os recursos. Limita-se a dizer que dois fundos de investimento ligados à J&F garantirão a operação.
O posicionamento de Fraxe também fará com que população pague, via conta de luz, 16 bilhões de reais pelos próximos 15 anos. É o montante que os Batista entendem ser necessário para garantir o funcionamento da companhia amazonense. Esse valor foi questionado pela área técnica da Aneel, que opinou pelo financiamento com metade do valor proposto pela Âmbar.
Outro problema apontado pela área técnica da agência reguladora foi a falta de experiência da Âmbar Energia na distribuição energética. Os servidores argumentaram que a empresa da J&F atua apenas com produção de energia e que a compra da Amazonas Energia é a primeira incursão da companhia nessa área do setor elétrico.
Toda ajuda é bem-vinda
A batalha judicial pela venda da Amazonas Energia também se trava no Tribunal Regional Federal da 1 Região, onde o grupo dos Batista avança com semelhante sucesso. O caso chegou à corte após uma decisão tomada pela juíza Marília Gurgel R. de Paiva, da 8ª Vara Federal Cível do Amazonas, em agosto de 2024.
Naquele mês, Paiva deu 72 horas para a Aneel regulamentar a medida provisória 1.232. Para garantir o cumprimento da decisão, ela impôs cobrança de 1 milhão de reais, acrescida de 10 mil reais por dia de descumprimento da ordem. A MP foi editada no ano passado pelo governo Lula para criar condições que permitissem à J&F adquirir a Amazonas Energia.
A decisão que impôs as multas e o prazo de 72 horas foi a única tomada pela juíza Paiva no caso. A Aneel recorreu da determinação da juíza via agravo de instrumento e o TRF1 decidiu, em 21 de setembro, manter parcialmente as obrigações, excluindo as multas impostas aos diretores da agência. A anulação de parte da ordem da magistrada foi definida pelo desembargador Newton Ramos.
Porém, logo após essa decisão, Ramos se declarou suspeito para analisar a causa. Seu substituto no tribunal foi o desembargador Rafael Paulo Soares Pinto, que é o relator de ao menos três agravos de instrumento apresentados pela Aneel e que não foram decididos. O primeiro ato de Pinto no primeiro agravo foi anular a proteção concedida à Aneel contra as multas.
Sem a blindagem, Sandoval Feitosa, diretor-presidente da Aneel, proferiu duas decisões monocráticas que garantiram à Âmbar Energia o controle da Amazonas Energia, utilizando-se da expressão “sub judice”, o que tem gerado instabilidade ao negócio bilionário.
Após a decisão de Pinto, foi a vez de Ney Bello, também desembargador e corregedor do TRF1, analisar o caso. No plantão judicial de 5 de janeiro, Bello atendeu em parte o pedido da Cigás, apenas para sustar parcialmente a liminar de Fraxe, no ponto em que ordenou, sem a anuência da concessionária de gás, a conversão dos contratos de venda de energia em contratos de energia de reserva, de 13 termelétricas compradas pela Âmbar da Eletrobrás - mas ainda não quitadas em razão do imbróglio jurídico.
O pedido foi feito pela empresa do empresário Carlos Suarez e do estado do Amazonas porque a companhia fornece o gás usado por diversas usinas termelétricas que abastecem o sistema elétrico do Amazonas. Na suspensão de liminar, a Cigás buscava também suspender a decisão de Fraxe no ponto relativo à transferência da Amazonas Energia para os Batista, o que foi negado pelo corregedor no plantão do recesso.
Como os irmãos Batista estão comprando a Amazonas Energia depois de terem adquirido 13 térmicas da Eletrobras, muitas delas consumidoras do gás fornecido pela Cigás, Suarez está preocupado que essa nova configuração empresarial possa atrapalhar seus negócios. Por conta disso, ele tem tentado garantir que sua voz seja ouvida desde o início do processo.
Bello foi logo desautorizado pelo presidente do TRF1, João Batista Moreira, que viu na atuação da Cigás apenas interesses comerciais, sem qualquer prova de grave lesão ao interesse público. No último dia 10, Moreira revogou a decisão do colega afirmando que a Cigás não tem legitimidade para ativar Suspensão de Liminar, que é um incidente garantido ao Poder Público.
Além de revogar a decisão de Bello, Moreira encerrou o incidente e determinou a impossibilidade de qualquer novo questionamento similar pela Cigás, que já apresentou recurso e promete levar o caso ao Órgão Especial do tribunal. De acordo com a decisão do presidente do TRF1 não se analisou em momento algum a legitimidade da empresa de Suarez e do Amazonas em participar da discussão capitaneada pela juíza Fraxe na primeira instância, que é o questionamento principal da companhia de gás.
Leia a última decisão proferida pela juíza Jaiza Fraxe e decisão do TRF1:
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