Ninguém mexe com ele

Alisson Matos
Publicada em 22/06/2024 às 15:40
Lindoso foi por três anos o administrador judicial do caso Foto: Reprodução/redes sociais

Apesar de se arrastar por mais de uma década, o maior processo de massa falida do Brasil, da Usina Laginha, em Alagoas, acelerou-se recentemente no Judiciário local. A Laginha pertencia ao ex-deputado João Lyra, falecido em 2021. A disputa pelo controle da massa falida e, acima de tudo, pela divisão dos precatórios bilionários em nome dela mexeu com os nomes mais influentes do estado. Chegou ao Superior Tribunal de Justiça e até ao Supremo Tribunal Federal. Alguns dos maiores advogados do Brasil travam uma batalha feroz para liberar os bilhões que estão em jogo.

Há múltiplos teatros de operação nessa guerra judicial. Um dos principais está, evidentemente, no processo da massa falida da Laginha em Alagoas. É nele que uma comissão de juízes supervisiona o andamento do caso, para saber o que a massa falida ainda tem de ativos, a quem ela deve e como se pode pagar os credores.

Nesse tipo de processo, o juiz, ou, no caso, a comissão de juízes, nomeia um administrador judicial, conhecido no jargão como AJ. É uma posição poderosa. Cabe ao AJ auxiliar os juízes. Organiza as listas de credores e de devedores; tenta resolver controvérsias; e negocia, em tese, os melhores termos possíveis em benefício dos deveres da massa falida. Deve trabalhar, em nome da Justiça, para que os credores, entre eles a União, recebam o que lhes é devido - e para que o processo tenha um fim.

Nas últimas semanas, houve uma sucessão de fatos extraordinários no processo da massa falida da Laginha. O Tribunal de Justiça de Alagoas, o TJAL, destituiu subitamente a comissão de juízes, abrindo correição contra um deles. Em seguida, o TJ começou uma auditoria extraordinária na massa falida. Logo depois, nomeou uma nova comissão de juízes, que, por sua vez, destituiu o administrador judicial e, sem perder tempo, nomeou um substituto. Tudo isso aconteceu num espaço de sete dias.

A nova fase do processo é repleta de controvérsias. Como mostrou o Bastidor, o AJ escolhido foi o advogado Armando Lemos Wallach, da empresa Vivante Gestão e Administração Judicial LTDA. A decisão é assinada pelos os juízes Helestron Silva da Costa, Thiago Augusto Lopes de Morais e Nathalia Silva Viana.

Os magistrados dizem que foi feita “pesquisa ampla e entrevistas com pretensos candidatos” e que o escritório Vivante Gestão e Administração Judicial “atende ao perfil reclamado”, mas omitem que há uma proximidade de Wallach a pessoas ligadas a Helestron Silva da Costa.

A intervenção do TJ naquele que talvez seja o principal processo de Alagoas aconteceu imediatamente após a antiga comissão de juízes reprovar as contas do antigo administrador judicial da Laginha. Trata-se do economista José Luiz Lindoso da Silva. Ele foi AJ da massa falida entre 2017 e 2020. É um personagem com ampla influência. Tem numerosos aliados no mercado nacional de recuperações judiciais e falências.

Embora o Tribunal de Justiça de Alagoas tenha dito que resolveu agir agora para identificar irregularidades no processo da Laginha, Lindoso, como é conhecido, ficou de fora do escopo da auditoria - chamada de "correição". Apenas atos posteriores a 2020 serão analisados nessa auditoria, apesar da reprovação recente das contas de Lindoso. Os juízes designados para o trabalho fiscalizarão o que aconteceu no processo desde então.

A benesse à Petrobras

O Bastidor teve acesso ao relatório que analisou e reprovou as contas de Lindoso. Foi assinado pelos três juízes que, duas semanas depois, foram expulsos do caso.

Num caso que configuraria conflito de interesses, os juízes dizem que Lindoso, como AJ, pagou despesas dos advogados Camila Oliveira de Petribu e Lucas Cavalcanti Carvalho, do escritório Queiroz Calvalcanti, e Paula Lobo, do Fonte Advogados. Além de não ter solicitado formalmente a contratação dos três para atuarem diretamente no processo, descobriu-se que dois deles – Lucas Cavalcanti e Camila Oliveira - assinaram petição como representantes Petrobras Distribuidora S.A, que tem valores a receber da massa falida.

Foi comprovado ainda que a Petrobras foi beneficiada com um parecer de Lindoso. Ele deu à empresa o direito de receber mais 200 mil reais após um pedido de alteração de crédito formulado pela defesa da petroleira.

A decisão dos juízes é direta ao determinar a rejeição das contas. Afirmam eles: “Diante da constatação de que, primeiro, o juízo falimentar não autorizou o dispêndio nem a contratação dos profissionais mencionados, segundo, a massa falida custeou despesas de profissionais que não tinham qualquer vínculo direto, nem autorização do juízo para em seu nome atuar, terceiro, que não há comprovação direta de que aquelas despesas reembolsadas foram definitivamente vinculadas à atividade que o ex-auxiliar tentou justificar, quarto, que os profissionais mencionados não poderiam, em qualquer hipótese, atuar em nome da massa falida, em razão do manifesto conflito de interesse, já que representavam juridicamente credor inscrito no processo falimentar”.

As suspeitas sobre Lindoso também recaíram em juízes que autorizaram a sua entrada no processo. Uma das partes do processo acusou os magistrados Phillippe Melo Alcântara Falcão, Marcella Waleska Costa Pontes, Bruno Araújo Massoud e Filipe Ferreira Munguba de favorecerem o então administrador judicial. Maria de Lourdes Pereira de Lyra, filha de João Lyra e curadora, dizia que a atuação de Lindoso tinha indícios de má condução e omissão administrativa.

Em 2019, os quatro juízes chegaram a homologar uma transação para liberar uma parte incontroversa de precatórios, algo em torno de 700 milhões de reais, em discordância com os representantes da massa falida e favoráveis aos credores. Uma das testemunhas é justamente Lucas Cavalcanti Carvalho, aquele que atuou para Lindoso e para uma das credoras da massa falida.

À época, a defesa da massa falida apresentou contestações sobre a quantia destinada a um fundo que havia adquirido créditos que renderiam valores considerados vantajosos. Os juízes desconsideraram as alegações e escreveram que a “homologação desse juízo apresenta condições mais favoráveis à massa do que as originalmente pactuadas”.

Lindoso acabou afastado em 2020, após decisão do desembargador Kléver Loureiro, do TJ, que também suspendeu, à época, pagamentos aos credores a pedido de Maria de Lourdes Lyra.

A relação de Lindoso com os juízes resultou na sequência em uma renúncia coletiva dos magistrados diante da possibilidade de um julgamento sobre a suspeição deles no TJ. A decisão evitou que a Corte julgasse uma ação contra os juízes.

O quarteto foi substituído em 2021 pelos juízes que em maio deste ano assinam a decisão sobre a reprovação das contas de Lindoso. Agora, contudo, o Tribunal de Justiça de Alagoas afastou também esses magistrados e determinou, por meio do corregedor, Domingos de Araújo Lima Neto, a realização da auditoria.

O desembargador designou, entre os juízes que farão parte da correição, dois que já participaram do processo: Phillippe Melo Alcântara Falcão e Marcella Waleska Costa Pontes Garcia, que foram acusados de favorecer Lindoso.

Outras atuações

Lindoso já esteve envolvido em suspeitas em outros casos famosos de falência.

Um deles diz respeito à recuperação judicial da Organização Arnon de Mello, um dos maiores conglomerados de mídia do Norte e Nordeste, da família Collor de Mello em Alagoas. O grupo foi fundado por Arnon de Melo, pai do ex-presidente Collor de Mello.

Em 2022, o Ministério Público chegou a pedir a abertura de um inquérito policial para investigar a prática de crime falimentar cometido durante a recuperação judicial.

O Bastidor teve acesso ao documento. Nele, o promotor de Justiça Marcus Aurélio Gomes Mousinho disse que “a atuação como auxiliar do juízo da Lindoso e Araújo Consultoria Empresarial” deixou de cumprir os deveres impostos pela legislação.

De acordo com o MP, houve empréstimos do grupo de comunicação aos sócios durante o período da recuperação judicial, o que é proibido. O valor analisado foi de 6 milhões de reais.

“Sob esse prisma, não há lógica nas afirmações do Administrador Judicial sobre não ter sido informado ou não ter verificado ‘mútuos dessa natureza’ e nem sobre a ausência de notificação de ‘qualquer mútuo entre as devedoras e seus sócios’. Incumbe ao auxiliar do juízo fiscalizar e verificar as movimentações, suspeitas ou não, nos relatórios contábeis e tais afirmações só corrobora com a alegação dos credores sobre a sua omissão na execução do seu ofício”, acrescentou o promotor.

Lindoso também deixou marcas como administrador judicial da massa falida da usina Catende, em Pernambuco. O Bastidor teve acesso a um documento protocolado em 2023 por uma comissão de ex-funcionários da usina que pedem o seu afastamento.

Alegam que, além de não receberem os créditos trabalhistas, presenciaram a completa destruição do patrimônio da usina, apesar das denúncias apresentadas.

“A má gestão administrativa do atual Síndico iniciada no ano de 2012, clara e cristalina, só não vê quem não quer”, diz o documento. “Acontece que dilapidaram a parte industrial, levaram (subtraíram) as válvulas das caldeiras, vários equipamentos valiosos da parte elétrica, os quadros de força, um verdadeiro escárnio contra um patrimônio da Usina, quem deveria preservar o patrimônio, para um posterior leilão, suprir as verbas dos trabalhadores. O interessante que ninguém viu, não se sabe de nada, todos silenciaram, inclusive o atual síndico”.

O Bastidor procurou Lindoso por telefone e por e-mail mais de uma vez e perguntou sobre a relação dele com os advogados e a sua versão dos fatos, mas não obteve retorno até a publicação deste texto.

A corregedoria do TJ-AL disse à reportagem que em outubro de 2021 foi realizada uma correição extraordinária no processo por determinação da então Corregedora Nacional de Justiça, ministra Maria Thereza de Assis Moura. Por isso, essa nova auditoria tem como marco inicial o período posterior a outubro daquele ano.

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