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A operação clandestina da Abin no Complexo do Alemão

Diego Escosteguy
Publicada em 21/10/2023 às 11:59
Operação clandestina em comunidades do Rio rachou a Abin Foto: Pedro Ladeira/Folhapress

Aliados da família Bolsonaro na Agência Brasileira de Inteligência conduziram uma operação clandestina de espionagem nos Complexos do Alemão e da Maré, no Rio de Janeiro, no segundo semestre de 2021, relataram ao Bastidor, sob condição de anonimato, quatro fontes do órgão a par do caso.

A operação não tinha relação aparente com a atividade de inteligência de Estado, função da Abin. Segundo oficiais de inteligência que tinham conhecimento de detalhes operacionais e estratégicos da operação, a coleta secreta de informações em comunidades controladas por narcotraficantes exigiu o uso extensivo de recursos humanos, logísticos e financeiros da Abin.

Para os oficiais de inteligência, a operação clandestina constituía, na melhor das hipóteses, um desvio de finalidade dentro da Abin: uma operação de segurança pública, que seria da alçada das polícias do Rio de Janeiro, para auxiliar o combate ao crime no estado. O que ninguém conseguia responder era: para que a Abin precisaria coletar informações em áreas do Rio sob controle de organizações criminosas associadas ao narcotráfico? Essas organizações criminosas, por sua vez, estavam em guerra e eram adversárias das principais milícias do Rio.

Quando o assunto era discutido em reuniões internas, surgia a justificativa de que a operação estava coberta legalmente e que, de fato, visava a subsidiar as polícias do Rio de Janeiro com inteligência sobre alvos. Os críticos da operação na agência não entendiam por que a Abin deveria se meter em algo que, para todos os efeitos, não é da alçada da agência.

A operação era liderada pelo então superintendente da Abin no Rio, Victor Felismino Carneiro, homem de confiança de Alexandre Ramagem e da família Bolsonaro. Em seguida, ele viria a se tornar diretor-ajunto da agência.Também participavam agentes da PF lotados na Abin, todos fiéis a Ramagem e a Bolsonaro. O principal coordenador da operação era o agente da PF Felipe Arlotta Freitas.

Entre agosto e outubro de 2021, a operação clandestina no Rio drenou dinheiro que deveria ser destinado a operações de contraterrorismo em São Paulo e na Tríplice Fronteira. Além do uso de drones, motos e outros aparatos da Abin, houve também, de acordo com os oficiais que tinham acesso limitado ao planejamento da operação, gastos altos com ao menos sete fontes humanas, mediante acesso à verba secreta do órgão. O gasto previsto com elas somava, ao menos, 168 mil reais por trimestre. Não se sabe exatamente quanto tempo a operação durou nem se ela resultou, de fato, em alguma inteligência acionável ao governo do Rio. Fontes com acesso aos sistemas da Abin asseguram que nenhum relatório foi disseminado com base nas atividades nas comunidades.

A pressão política para que a operação fosse autorizada e dinheiro, canalizado a ela, em detrimento de operações de contraterrorismo, em aparente arrepio à legalidade, causou uma crise forte na Abin. O então diretor de Operações, Paulo Maurício Fortunato, oficial de carreira, saiu do cargo. (Ele era o número 3 da agência no governo Lula e foi alvo da PF na operação de ontem.) Agentes da PF leais a Ramagem e à família Bolsonaro assumiram interinamente o vácuo na área de operações. Isso deu latitude para que a operação no Rio fosse conduzida sem oposição interna forte.

Em 2022, quando Ramagem estava prestes a ceder lugar a Carneiro, o chefe do GSI, general Augusto Heleno, pressionado por subordinados na Abin, cobrou explicações do ex-superintendente do Rio acerca da "operação no Alemão". Carneiro respondeu que a operação seguiu os requisitos legais. Ato contínuo, oficiais de carreira provocaram informalmente a Comissão de Controle de Atividades de Inteligência do Congresso, para que o Parlamento investigasse a legalidade da operação. Foram ignorados pelos parlamentares.

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