Sem dizer Oi a ninguém
Em uma votação no plenário virtual, restrita aos conselheiros, sem aviso ou divulgação, a Anatel decidiu dar sobrevida à Oi. Uma das decisões mais relevantes do mercado de telefonia, que já custou 17 bilhões de reais ao contribuinte, foi tomada no dia 14, por meio de um sistema em que os votos e argumentos ficam longe do público.
Nessa modalidade, o relator deposita seu voto de forma digital e só é apresentado outro voto se houver divergência, mesmo que parcial. Não há debate entre os conselheiros da Anatel ou transmissão para o público externo. O modelo é parecido com o usado pelo Supremo Tribunal Federal e pelo Superior Tribunal de Justiça.
A questão foi resolvida nos métodos que a burocracia de Brasília proporciona. Segundo a Anatel, o relator do caso, Alexandre Freire, pediu no próprio dia 14 para que o processo fosse pautado. A votação foi realizada no mesmo dia, rapidamente, sem divulgação pública.
Houve duas tentativas anteriores de julgar a questão no colegiado físico, às claras. As sessões previstas para 9 e 25 de outubro seriam presenciais e transmitidas pelo YouTube. A imprensa foi informada. Seus adiamentos, no entanto, foram acompanhados de poucas explicações. Um dos argumentos foi a necessidade de ajustes pela empresa, para adequação à legislação e ao combinado entre Anatel, Tribunal de Contas da União, Advocacia-Geral da União e Oi.
Na prática, a Anatel permitiu que, mesmo em sua segunda recuperação judicial consecutiva, a Oi migre do modelo de concessão para o de autorização. Poderá continuar oferecendo à população serviços de internet e telefonia (fixa e móvel) como se nunca tivesse dado prejuízo ou tivesse sido investigada na Lava Jato por corrupção.
Após o julgamento, a Anatel divulgou apenas uma nota, destacando quão importante foi a decisão da qual poucas pessoas sabem o suficiente. Segundo a agência, a medida "inédita" é um "marco importante", resultado do "complexo processo de negociação entre a Anatel, o Tribunal de Contas da União, a Advocacia-Geral da União e o Grupo Oi". Nada foi dito sobre o que foi aprovado.
É possível encontrar mais detalhes sobre o processo num texto publicado pela Oi em seu site. Há menção a "investimentos de aproximadamente R$ 6 bilhões".
O acordo firmado com a benção do presidente do Tribunal de Contas da União, Bruno Dantas, e do ministro Jorge Messias, chefe da Advocacia Geral da União, não especifica como a Oi fará esses investimentos e deixa a empresa livre para atuar conforme sua conveniência, como já mostrou o Bastidor.
O acordo também não detalha que a salvação da Oi já custou 17 bilhões de reais à população. O valor foi um desconto de concedido pela Anatel sobre os 20 bilhões de reais que a empresa deveria investir em infraestrutura pública de telefonia.
O pacote em favor da Oi pode ser maior e custar até 60 bilhões de reais ao contribuinte. O montante pode ter que ser pago pela União caso a empresa vença uma disputa arbitral em que pede ressarcimento aos cofres públicos por investimentos considerados ultrapassados, como a manutenção de orelhões.
Ao analisar o acordo, o TCU e a Anatel consideraram ínfima a chance desse pagamento bilionário ter que ser feito pelo erário. Porém, mesmo que a União não tenha que devolver 60 bilhões de reais à Oi, ela já perdeu a chance de outros ganhos por ter desistido de todas as ações que tinha contra a empresa de telefonia. Essa foi uma das regras do acordo. A única discussão que pôde ser mantida foi a arbitragem.
Lucrando no carona

Quem mais lucrou com a vitória da Oi em 14 de novembro foi André Esteves, do BTG, por meio da V.tal, sua empresa no setor de telefonia e parceira da Oi em muitos negócios, inclusive no acordo. O banqueiro está com a Oi na disputa arbitral de 60 bilhões de reais, travada na Câmara de Comércio Internacional desde 2020.
O dono do BTG escapou, ainda, de arcar com qualquer punição que venha a ser imposta pelo governo por eventuais descumprimentos contratuais. Apenas a Oi responderá. As negociações excluíram a V.tal de qualquer responsabilidade caso o pactuado saia dos trilhos.
O presidente do TCU, Bruno Dantas, garantiu o julgamento do caso e conseguiu fazer tudo tramitar em sigilo. O setor criado por Dantas, a Secex Consenso, foi o responsável por anular os argumentos da área técnica e viabilizar o aspecto burocrático do negócio em favor da Oi.
O Bastidor questionou Anatel e Oi sobre o sigilo de todo o processo que garantiu a migração da concessão à empresa para o regime de autorização. Não responderam.
Leia o que o Bastidor já publicou sobre a Oi:
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