A força do esquema
Relatório sigiloso da Polícia Federal obtido pelo Bastidor revela que o grupo Fource movimentava altas somas de dinheiro, com indícios de lavagem, no esquema de comércio de decisões judiciais descoberto pela PF no Superior Tribunal de Justiça e em tribunais estaduais.
O grupo Fource é comandado por personagens que se tornaram relevantes na investigação que corre sob a relatoria do ministro Cristiano Zanin, no Supremo. São eles: Valdoir Slapak, Heraldo dos Reis e Haroldo Filho.
Valdoir atua em estados como Mato Grosso, Bahia e Tocantins, onde é suspeito de operar esquemas judiciais, sobretudo na área de compra e venda de créditos. Não é pequeno: lida com operações que chegam a bilhões de reais. Embora seja desconhecido do público, também tem boas relações e conexões com personagens grandes de Brasília.
Ele e sua empresa estiveram envolvidos em grandes casos - em valores e repercussão - de recuperações judiciais e falências. Alguns exemplos são o da camisaria Colombo, da Olvepar e do grupo Jesus Agropecuária. Este último caso foi investigado na Operação Faroeste, que apura a venda de decisões judiciais no Tribunal de Justiça da Bahia.
A investigação em curso aponta que Valdoir, por meio da Fource, era parceiro do advogado Roberto Zampieri no esquema de compra e venda de decisões judiciais no Mato Grosso. Zampieri é o advogado que foi assassinado em dezembro de 2023, e cujos dados do celular deram início ao inquérito que chegou ao Supremo. Zampieri, por sua vez, agia ao lado do lobista Andreson de Oliveira Gonçalves, aparente líder da organização. Andreson está preso, e a investigação avança em ritmo acelerado. Hoje, houve uma nova fase da operação.
Os dados bancários e fiscais dos investigados, aos quais a reportagem teve acesso, revelam fortes indícios de que todos agiam em grupo. Valdoir, por meio do grupo Fource, tinha ligação direta e indireta com empresas de fachada e fundos de investimento que serviam, segundo as investigações, tanto para lavar dinheiro quanto para pagar os beneficiários do esquema. Há pagamentos para escritórios de advocacia, empresas de Brasília, imobiliária, estabelecimentos agrícolas e de turismo, além de instituições financeiras.
Ao todo, somente em operações consideradas suspeitas pela PF, a Fource pagou cerca de 94 milhões de reais e recebeu algo em torno de 56 milhões de reais.
O caso Colombo
Os dados jogam luz, por exemplo, na participação da Fource na recuperação judicial da Colombo. Como revelou o Bastidor, um fundo de investimentos suspeito de ter entre os beneficiários os donos da camisaria Colombo, o Afare I, pagou ao menos 7,5 milhões de reais a Zampieri.
Os documentos mostram que, nesse caso, Zampieri atuava ao lado de Valdoir. Este tinha relação com o fundo Afare I, que está no centro das alegadas fraudes da recuperação judicial da Colombo. Para credores da camisaria Colombo, são os donos da empresa, Álvaro e Paulo Jabor Maluf, que estão por trás do fundo. De acordo com uma fonte que participava do negócio, Valdoir e os donos da Colombo se desentenderam - e o Afare ficou sob controle de Valdoir.
Em 2018, o Afare aprovou pagamento de 8 milhões de reais para a Fource. Mas a relação entre as partes é mais profunda e extensa. Segundo análise da PF, Valdoir teve relação com o Afare I por meio das empresas Alamo Comércio e Participações e Agropecuária L Boccalato. Há um corredor de transações bancárias entre as partes, usando o Afare I: o fundo pagou 7,5 milhões de reais a Zampieri e Zampieri pagou 1 milhão de reais à Fource, de Valdoir. A Fource pagou 2,3 milhões de volta a Zampieri. As operações aconteceram no mesmo período em que o grupo vendia e comprava decisões judiciais.
No mesmo período, como mostrou o Bastidor, a Colombo obteve decisões judiciais favoráveis no Mato Grosso e no STJ. Mensagens trocadas entre os operadores reforçam as suspeitas de compra de decisões. Em uma delas, Zampieri escreveu a Valdoir: “O da Colombo e o da quebra de sigilo deu tudo certo”. Ele se referia à decisão do desembargador João Ferreira Filho, que negou pedido dos credores para identificar os cotistas do fundo Afare. Segundo a PF, Zampieri prometeu ao desembargador um relógio da marca Patek Philippe, avaliado em 300 mil reais.
Zampieri chegou a escrever para Valdoir: “Lembra do que te pedi sobre o relógio do nosso amigo? Eu estou em SP, gostaria de passar esse valor pra ele comprar o relógio. Se você puder arrumar esse valor pra hoje seria bom, mas se não for possível eu entendo. Só me avise. Abraços". O dono da Fource respondeu: "Boa noite. Tenho duas camionetas para te passar para acertar nossa conta de 400 [mil]. Topa?”.
O Bastidor procurou a assessoria da Fource e perguntou sobre a relação da empresa e de Valdoir com os personagens citados na matéria. Também questionou o volume e os valores das transações financeiras.
Em nota, a assessoria disse que "os sócios da Fource repudiam avaliações precipitadas e afirmam que sempre atuaram dentro da mais absoluta lisura e transparência colocando-se desde já à inteira disposição da Justiça para o mais célere esclarecimento".
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