Advogando no escuro
A imposição de julgamentos virtuais pelo Judiciário tem preocupado a advocacia, que teme ser ignorada. A medida é possível graças a uma resolução do Conselho Nacional de Justiça que passará a valer em 3 de fevereiro.
A norma, assinada por Luis Roberto Barroso, presidente do CNJ, e Mauro Campbell, corregedor nacional de Justiça, deixa a critério de cada juiz como será o andamento da ação. São duas modalidades: exclusivamente virtual, incluindo os julgamentos, ou tradicional, quando o processo tramita eletronicamente, mas a análise é feita presencialmente no tribunal.
Nas ações que tramitarão exclusivamente de forma virtual, as alegações feitas pelos advogados antes dos julgamentos, conhecidas como sustentações orais, serão apresentadas via vídeo gravado previamente pelo profissional e encaminhado ao magistrado responsável pelo caso.
Dirigentes da Ordem dos Advogados do Brasil ouvidos pelo Bastidor acreditam que poucos juízes darão a atenção devida aos argumentos da advocacia nos processos que tramitarem apenas virtualmente. Segundo essas fontes, o Judiciário, depois de resistir por anos a aderir à digitalização, aceitou a mudança agora para não ter que lidar com a advocacia.
Essa limitação, continuam as fontes, apenas ajudará aqueles advogados que já vêm de famílias tradicionais do Direito ou os que são parentes próximos de ministros, desembargadores ou juízes. "Isso só ajuda os amigos do rei", disse um presidente de seccional da OAB.
A amizade com a corte também é citada como argumento para criticar o conselho federal da OAB. Há muitas dúvidas sobre a real vontade do órgão em enfrentar esse problema. Os advogados que integram o colegiado atuam em Brasília e não gostam de desagradar ministros de cortes superiores, os mais influentes no Judiciário.
Há uma semana, conselheiros federais da OAB disseram a presidentes de seccionais que combateriam a mudança. Mas nada foi feito até agora para convencer a elite do Judiciário, segundo as fontes.
Desde o começo deste mês, o conselho federal da OAB apresentou uma petição ao CNJ pedindo a nulidade da resolução. A entidade também lançou na terça-feira (28) um "movimento nacional em defesa da sustenção oral".
Outro ponto da virtualização dos julgamentos que prejudica a advocacia é a falta de conhecimento digital do Judiciário. No início dos anos 2000, quando todo o acervo processual brasileiro passou a ser digitalizado, muitos magistrados resistiram à mudança com os mais variados argumentos. Um deles foi a ausência de experiência com tecnologia.
Anos se passaram, mas o problema persiste. Uma das fontes ouvidas afirmou que já ouviu reclamações de desembargadores sobre a virtualização justamente por conta da falta de conhecimento. Um desses julgadores disse que ele e os servidores de seu gabinete não sabem como baixar os vídeos do sistema processual.
Um segundo magistrado alertou um dirigente da Ordem sobre o tamanho da infraestrutura tecnológica necessária para armazenar todos os vídeos que serão enviados pelos advogados. Cada filmagem, segundo a norma editada pelo CNJ em outubro de 2024, poderá ter até 15 minutos. Em tribunais de justiça com grande volume processual, como o de São Paulo, o espaço necessário superará facilmente a casa dos terabytes.
Falta ainda, segundo as fontes, mais clareza nas regras da virtualização dos julgamentos. Advogados temem que a discricionariedade dos juízes sobre o tema remeterá a maioria das causas para julgamentos digitais.
Em países como a Inglaterra, quem escolhe o modelo de julgamento do processo é o advogado e as sustentações orais são proibidas em determinados casos, a depender da gravidade e da complexidade da ação. Sem essas balizas, afirmam as fontes, há margem para abusos.
Notícia atualizada às 14h42 de 29 de janeiro de 2024, para inclusão das medidas adotadas pela OAB contra a resolução do CNJ.
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