O construtor de crises
A ida do assessor especial da Presidência da República, Celso Amorim, à Venezuela, para acompanhar as eleições no país vizinho, mostrou-se – como se esperava – uma ótima ideia - uma ótima ideia para o ditador Nicolás Maduro. A presença de Amorim, aliada ao silêncio do presidente Lula, serviu ao propósito político de Maduro de usar o Brasil para ajudar a conferir legitimidade a um pleito que já era ilegítimo, pelo evidente abuso de poder, antes de uma votação com fortes indícios de fraudes.
Como não houve qualquer surpresa nas eleições, o comportamento de Amorim em Caracas, secundado por Lula, tornou o Brasil sócio de uma encrenca geopolítica que ameaça queimar a Venezuela. Sob palavras de ordem como "cautela" e "construção de consensos", Amorim e seus aliados tentam projetar a imagem de sobriedade política e de preocupação com a estabilidade na Venezuela.
Exponha intenções sinceras ou cascatas, esse fraseado trai uma confiança injustificável no regime de Maduro e uma incapacidade atávica de interpretar a realidade política da Venezuela - uma realidade alicerçada, em parte, pelo apoio geopolítico e econômico dos governos petistas.
Hoje, "cautela" significa pusilanimidade. A única coisa que Amorim constrói são crises. Quando conveniente, como é o caso, apela-se ao respeito da diplomacia brasileira à soberania de outros países. É uma maneira de não se comprometer com nenhum outro princípio. Serve apenas quando a crítica é necessária. No momento do elogio, deixa-se a soberania para lá.
Amorim teria mais autoridade e crédito se ele e Lula não fossem responsáveis, na medida de suas responsabilidades, pela tragédia venezuelana. São anos e anos da mesma ladainha. Se o governo brasileiro é tão influente junto a Maduro, o que, exatamente, pode Amorim negociar com sucesso junto ao regime? Como pode, exatamente, contribuir para um desfecho satisfatório para a crise que se aprofunda?
Talvez seja eloquente a falta de respostas para perguntas tão simples. Na segunda-feira (29), depois de o resultado ser oficializado pela Comissão Nacional Eleitoral (CNE), o governo brasileiro emitiu nota em que afirmou esperar pela divulgação completa das atas eleitorais – o equivalente aos boletins de urna no Brasil – antes de se posicionar sobre a reeleição de Maduro.
A tática de aparentar estar em cima do muro falhou miseravelmente. Ao longo do dia, a oposição aumentou as críticas ao resultado eleitoral, enquanto Maduro teve o resultado confirmado pelo CNE. Fosse pouco, resolveu expulsar os embaixadores dos países que ousaram contestar a reeleição. No Brasil, Lula e os principais apoiadores passaram o dia calados.
Amorim foi o único a dar algumas declarações à imprensa brasileira. Chegou a se reunir com Maduro e tentou, sem sucesso, se encontrar com o candidato oposicionista, Edmundo González.
González e os demais apoiadores afirmaram, em um ato público, que tiveram acesso a 73% das atas eleitorais e que elas mostrariam uma vitória ampla da coalizão que tenta derrubar Maduro. "Com as atas que nos faltam, mesmo que o Conselho Nacional Eleitoral tenha dado 100% dos votos a Maduro, eles não são suficientes", afirmou a líder do grupo, María Corina Machado.
O Bastidor chegou a questionar Amorim sobre qual seria a tática do Brasil, caso surgissem documentos que comprovassem a vitória da oposição. Ele preferiu não comentar.
Ainda que tais documentos existam, como diz a oposição, é pouco provável que Maduro deixe a cadeira de presidente. Sendo assim, o papel de Amorim será o de chancelar a fraude ou incorrer no risco de ser expulso do país, como os embaixadores de outras nações. Na prática, portanto, não fará nada. Da mesma forma, Lula dificilmente tomaria uma posição mais drástica contra o ditador venezuelano para forçá-lo a sair do cargo. Logo, a única pergunta que sobra é: o que diabos Amorim foi fazer na Venezuela?
A ida do assessor de Lula, que foi chanceler do Brasil nas primeiras passagens do petista pela Presidência, representa um erro de cálculo monumental. Qualquer pessoa minimamente letrada em política externa sabia que Maduro faria exatamente esse circo, com ou sem suspeitas de fraude. Por pouco, o Tribunal Superior Eleitoral não caiu na mesma armadilha.
Ocorre que Amorim sempre se mostrou entusiasta pela política de integração bolivariana, defendida pelo antecessor de Maduro, Hugo Chávez, e mantida pelo atual presidente. O governo não confirma, mas provavelmente foi ele próprio quem convenceu Lula a enviá-lo a Caracas.
Independentemente do resultado da pataquada, Lula também se queima internamente. A oposição usará o fracasso do presidente na Venezuela para forçar um debate sobre esse tema nas próximas semanas e meses. Caso a fraude venezuelana seja devidamente comprovada, precisará tomar alguma medida enérgica contra um presidente que apoia abertamente. Se não houver a comprovação, também será acusado de ser conivente com Maduro.
Em tempos de dificuldade para negociar com o Congresso, de manter uma agenda positiva no governo, com a popularidade em queda, o caminho mais fácil passa pela fritura de Amorim. Responsabilizá-lo pela falta de consenso sobre a Venezuela e defenestrá-lo é a saída estratégica para reduzir os danos à imagem do presidente, caso a situação na Venezuela agrave-se. Depois disso, Lula deveria fazer algo que se recusa desde o primeiro mandato: passar mais tempo no Itamaraty conversando com os embaixadores, para aprender um pouco mais sobre política externa, antes de se meter em novas roubadas.
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