As ligações entre o poder e a criminalidade no Rio de Janeiro

Samuel Nunes
Publicada em 10/05/2022 às 12:14
Rogério de Andrade chegou a ser preso, suspeito de mandar matar o também contraventor Fernando Iggnácio Foto: Jose lucena/Futura Press/Folhapress

Excetuando Benedita da Silva e Wilson Witzel, todos os ex-governadores do Rio de Janeiro das últimas três décadas passaram algumas temporadas na prisão. Mas a sacanagem não está apenas nos gabinetes da Alerj ou do Catete. Ela vem lá de baixo e já perdura há muitos anos.

A operação deflagrada hoje no Rio de Janeiro, com 29 mandados de prisão e outros 119 de busca e apreensão, apresenta, de novo, o que há de mais baixo e cruel com o cidadão que paga os impostos em dia e precisa conviver com o risco de ter um filho morto por uma bala perdida ou em um assalto à beira-mar. É o retrato mais fiel da impunidade brasileira.

Entre os 30 investigados da Operação Calígula, estão o bicheiro Rogério de Andrade, o filho dele, Gustavo de Andrade, o ex-policial militar Ronnie Lessa, uma delegada da Polícia Civil e um inspetor que trabalhava com ela, na 16ª DP, na Barra da Tijuca, bairro nobre da capital. 

Rogério de Andrade é sobrinho do contraventor Castor de Andrade, morto em 1997, depois de um ataque cardíaco. O tio dele fez fortuna com o jogo do bicho e outras atividades ilegais. 

Castor era figura da alta sociedade fluminense. Todos sabiam dos ilícitos e das suspeitas de assassinatos cometidos a mando dele, mas fechavam os olhos ao observar o dinheiro e lhe davam a influência pública para fugir das suspeitas que pairavam sob o “dono” do time de Bangu e da escola de samba Mocidade Independente de Padre Miguel.

O sobrinho, Rogério, comanda os negócios da família com mãos de ferro e chumbo grosso. Ele foi acusado de mandar matar o genro de Castor, Fernando Iggnácio, em 2020, que era apontado até então como principal herdeiro dos esquemas de jogo do bicho. Os dois eram rivais entre si. Apesar das fortes suspeitas, o caso foi arquivado por ordem do STF, em fevereiro deste ano.

A nova investigação mostra também que Rogério mantinha ligações desde 2009 com Ronnie Lessa, o policial acusado de matar a vereadora Marielle Franco, em 2018, em um caso que nunca teve uma solução definitiva. Lessa chegou a perder uma perna, quando trabalhava para o bicheiro como segurança. 

Depois de matar Marielle, Ronnie Lessa, que tem uma casa no mesmo condomínio que o presidente Jair Bolsonaro, na Barra da Tijuca, se aproximou novamente de Rogério. O Ministério Público diz que o ex-policial pretendia abrir uma casa de apostas chamada Quebra-Mar, na Barra da Tijuca, com previsão de expandir com novas unidades na Zona Oeste do Rio. 

A inauguração do local foi financiada por Rogério e administrada por Lessa e Gustavo de Andrade, filho do bicheiro. No dia da abertura, a casa de apostas foi fechada, durante uma operação da Polícia Militar.

Pagamentos a policiais

Os vultuosos subornos a policiais no Rio de Janeiro têm em Castor de Andrade um dos principais precursores da prática. Diversas investigações contra o bicheiro foram fechadas ou inviabilizadas ao longo das décadas, graças a ação de agentes corruptos, que atrapalhavam a persecução penal. A primeira condenação, por exemplo, só veio em 1993, poucos anos antes da morte dele.

Com Rogério de Andrade, isso continuou. Na atual investigação, o Ministério Público aponta que ele mantinha um esquema de pagamentos constantes a policiais civis. Na casa da delegada Adriana Belém, os investigadores encontraram 1,2 milhão de reais em dinheiro.

“A organização estabeleceu acertos de corrupção estáveis com agentes públicos integrantes de diversas esferas do Estado, principalmente ligados à Segurança Pública, incluindo tanto agentes da Polícia Civil, quanto da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro”, diz a promotoria em nota. 

“Nesta esfera, integrantes da organização, membros da PCERJ, mantinham contatos permanentes com outros policiais corruptos, pactuando o pagamento de propinas em contrapartida ao favorecimento dos interesses do grupo liderado por Rogério. Por outro lado, oficiais da PMERJ serviam de elo entre a organização e Batalhões de Polícia, que recebiam valores mensais para permitir o livre funcionamento das casas de aposta do grupo.”

Em um dos acordos envolvendo policiais civis, Rogério de Andrade conseguiu a liberação de 80 máquinas caça-níqueis, apreendidas durante operação da Polícia Civil. Os equipamentos foram retirados de caminhão, sob o pagamento de propinas.

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