Carga suspeita
O diretor-geral da ANM (Agência Nacional de Mineração), Mauro Henrique Moreira Sousa, e o Superintendente de Ordenamento Mineral, Cícero Pedro da Silva Filho, podem entrar na mira da Polícia Federal e da Controladoria-Geral da União após darem aval para exportação de ao menos 27 mil toneladas de manganês sem origem legal comprovada.
Documentos obtidos com exclusividade pelo Bastidor a partir dos órgãos de investigação, fiscalização e controle mostram que Mauro Henrique e Cícero Filho atuaram diretamente no desbloqueio da carga suspeita mesmo com a discordância de outros membros da ANM. Os registros oficiais detalham o local de extração do mineral, o trajeto incomum percorrido pela carga suspeita e o navio envolvido na operação.
Tudo começou no dia 3 de abril, quando chegou à agência uma denúncia anônima sobre uma grande quantidade de manganês, extraído de forma ilegal, que se encontrava no Porto de Vila do Conde, em Barcarena, no Pará.
O local é estratégico e tornou-se uma das principais rotas utilizadas por criminosos em esquemas fraudulentos de exportação de minérios, em especial o manganês, usado na produção de aço e em toda indústria siderúrgica. Os garimpeiros ilegais utilizam documentos de extração emitidos em outras unidades da federação para burlar a verdadeira origem do produto.
“Diante dessa situação, é crucial que a Agência Nacional de Mineração intervenha imediatamente e tome as medidas necessárias para evitar a perpetuação da exportação ilegal desse minério”, dizia o e-mail endereçado à ANM. O responsável pela denúncia ainda pediu “máxima urgência, a fim de evitar danos irreparáveis ao meio ambiente e às leis que regem a atividade mineradora em nosso país”.
No mesmo dia da denúncia, segundo troca de e-mails a que o Bastidor teve acesso, um diretor da ANM encaminhou a Cícero Filho, superintendente de Ordenamento Mineral, uma solicitação de informações sobre a regularidade da carga. A resposta veio horas depois, com uma série de questionamentos sobre a acusação feita anonimamente e justificativas a respeito da sua atuação no cargo.
Entre as atribuições do superintendente de Ordenamento Mineral, de acordo com o site da agência, é “prestar apoio no fornecimento de informações, subsídios, bem como ações necessárias para a resolução de conflitos, quando requisitado”.
Não foi o que ocorreu. Com a falta de informações, três diretores da ANM – Roger Romão Cabral, Caio Seabra Filho e Guilherme Santana Lopes – recorreram à direção da Companhia Docas do Pará e à administração portuária de Vila do Conde com informações extras sobre as irregularidades da carga de manganês e pedindo o bloqueio do embarque.
Chamou a atenção dos diretores a rota escolhida para a exportação do minério. A carga estimada em 27 mil toneladas se encontrava no Amapá, estado que conta com estrutura própria de escoamento, com o porto de Santana. Outra curiosidade é que o local é mais perto do Oceano Atlântico do que o porto Vila do Conde, no Pará.
Nos registros em posse da PF e da CGU, os diretores da ANM que pediram o bloqueio do embarque da carga fazem uma cronologia dos fatos e citam os argumentos de Cícero Filho e do diretor-geral da ANM, Mauro Henrique Moreira Sousa, para liberar a carga.
Cícero Filho, por exemplo, chegou a usar uma decisão sobre carga apreendida pela justiça para justificar a falta de informações sobre as 27 mil toneladas de manganês. Para a exportação de minério são levados em consideração notas fiscais condizentes com o volume transportado, período e meio de transporte [caminhões com placas ou outros meios]; recolhimentos de impostos com respectiva confirmação de passagem em fronteiras interestaduais, quando for o caso de produção em um estado e comercialização/exportação em outro; e verificação por fiscalização remota da existência de lavra na área que foi declarada como origem do produto.
Cinco dias após a denúncia anônima, em 8 de abril, o diretor-geral da ANM, Mauro Henrique Moreira Sousa, entrou no circuito de forma oficial. Em mensagem a Jardel Rodrigues da Silva, presidente da Companhia Docas do Pará, disse que as manifestações dos três diretores da agência “com imputação de práticas criminosas, sem um mínimo lastro probatório, e a devida apuração da denúncia, foram precipitadas” e “não traduz a posição institucional” da ANM.
“Face a essa circunstância, comunico que esta agência reguladora, doravante, não mais dará curso a qualquer pedido de análise e manifestação acerca de ordens de embarque ou documentação atinente à comercialização e à exportação de bens minerais, sem prejuízo da relação institucional com essa companhia, especialmente, na prestação de informação e nas áreas estritamente vinculadas às suas competências legais”, escreveu o diretor-geral.
A exportação ilegal de manganês é objeto frequente de investigação. No ano passado, no mesmo porto Vila do Conde, a PF e a Receita Federal, com a colaboração da ANM, deflagraram uma operação de combate à exploração e comercialização ilegais. Foram apreendidos na ação 100 mil toneladas do minério, com valor total de 50 milhões de reais, e 1.144 toneladas de cobre, com valor total de 1,1 milhão de reais.
Desde 2015 a PF intensificou as operações para desarticular grupos criminosos que operam na exportação do manganês no sudoeste do Pará.
O Bastidor procurou o diretor-geral da ANM, o superintendente e a agência, mas não obteve nenhuma manifestação.
Alvo da CPI
Mauro Henrique Moreira Sousa também foi alvo da CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) que investiga a Braskem no Senado Federal. O diretor-geral da ANM irritou os parlamentares e viu o relator da CPI, Rogério Carvalho (PT-SE), pedir a quebra do seu sigilo bancário.
O senador alegou que Mario Henrique “tem agido com o objetivo de tumultuar os trabalhos desta comissão, repassando a este colegiado informações incompletas ou dificultando o acesso a elas”. Indicado no governo do ex-presidente Jair Bolsonaro, Mauro fica no cargo até 2026.
Atualização às 17h46 de 16 de abril de 2024:
Em nota, Cícero Pedro da Silva Filho disse que a superintendência de Ordenamento Mineral “determinou a apuração da denúncia anônima que chegou à ANM no mesmo dia” e que a decisão “sobre a carga seguiu parecer da Procuradoria Federal Especializada (PFE), que orientou não ser competência da ANM liberar carga em embarque e desembarque, cabendo somente ao Porto de Barcarena essa prerrogativa”.
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