A comissão do amigo de ACM Neto no Carnaval de Salvador

Redação
Publicada em 30/08/2022 às 06:00
ACM Neto curte o Carnaval de 2015

O Carnaval de Salvador recebe anualmente quase um milhão de foliões, mas ninguém curte mais a maior festa de rua do mundo do que o publicitário Alexandre Augusto Teixeira Gonçalves, amigão de ACM Neto. Desde 2015, segundo ano de Neto à frente da Prefeitura da capital baiana, Alexandre Augusto virou, ao mesmo tempo, o rei do camarote e o senhor da pipoca. Ganhou o direito de captar patrocínios ao Carnaval - e de ficar com 20% sobre o dinheirão pago pelas empresas interessadas. É isso mesmo: qualquer empresa que quiser patrocinar o Carnaval de Salvador precisa negociar antes uma taxa com um dos melhores amigos do prefeito, e não com a Prefeitura. Se não topar pagar os 20%, pode esquecer o abadá.

Esse arranjo começou assim que ACM Neto assumiu o primeiro mandato como prefeito de Salvador, em 2013. No decorrer daquele ano, Alexandre Augusto, que trabalhara na campanha do amigo, deixou o cargo de vice-presidente da agência Propeg. Do amigo ACM Neto, recebeu a missão de transformar o Carnaval num negócio mais lucrativo.

Por pressão de Neto, a família de Ivete Sangalo, que até então cuidava dos patrocínios por meio da Mago Comunicação, aceitou repassar o controle da empresa a Alexandre Augusto. Como a Mago era bem conhecida no mercado publicitário, a manutenção do nome ajudaria a manter sob alguma discrição a chegada do grupo de ACM Neto. Ao menos no começo.

Assim que Alexandre Augusto tomou a Mago Comunicação, a Saltur, empresa do município que cuida formalmente do Carnaval, mostrou quem mandaria na folia baiana. No final de 2013, enviou um ofício à Ambev, que fechara meses antes uma cota de patrocínio com a Prefeitura para o Carnaval de 2014, no valor de 10 milhões. Deu um ultimato: ou a Ambev aceitava pagar 30 milhões na mesma cota - ou a Prefeitura rescindiria o contrato.

A cervejaria recorreu à Justiça para que a Prefeitura de Salvador cumprisse o contrato. Ou, ao menos, negociasse com razoabilidade. O ultimato da Saltur deixava nítido que o objetivo era forçar a Ambev a desistir da cota - provavelmente porque Alexandre Augusto e ACM Neto (foto abaixo) planejavam repassar a cota a outras cervejarias.


O mago do Carnaval baiano

Foi o que aconteceu. Alexandre Augusto fechou com o grupo Petrópolis, aquele que veio a cair por lavagem de dinheiro nas investigações da Lava Jato, e com a cervejaria Schin, que também fora objeto de operações por lavagem e sonegação fiscal. A Ambev, uma multinacional com um forte programa de integridade, resolveu ficar de fora. Desistiu do processo.

Após o Carnaval de 2014, o próximo passo do grupo de ACM Neto era formalizar o arranjo que eles haviam inventado. A Saltur promoveu uma concorrência naquele ano para contratar uma empresa que "prospectasse" patrocínios ao Carnaval. Embora a prática já existisse, não fazia sentido - a não ser para quem participava dela. O Carnaval de Salvador é um fenômeno. Não faltam empresas interessadas em pagar para se associar à folia. Por que colocar um intermediário entre a Prefeitura, que organiza o Carnaval, e a fila de empresas interessadas em patrocinar a festa? Por que estipular que essa espécie de atravessadora de patrocínio precisa receber 20% do valor do patrocínio?

Essas perguntas não foram enfrentadas. Ainda em 2014, a concorrência promovida pela Prefeitura teve duas participantes: a Mago, de Alexandre Augusto, e uma empresa que era sócia da Mago. Não houve surpresa quando se anunciou a vencedora. Ou vencedor: Alexandre Augusto. No contrato, por óbvio, estava lá o prêmio: 20% de taxa para o amigo de ACM Neto por cada patrocínio.

Em 2015, o Ministério Público da Bahia chegou a questionar a licitação e esse modelo. Mas, como em outros casos suspeitos que afetam os negócios dos amigos de ACM Neto com a Prefeitura, os promotores logo desistiram da investigação. 

Desde então, Alexandre Augusto passou a escolher, sem amarras, quais marcas poderiam participar do Carnaval. Conforme revelou o Bastidor, a influência do publicitário se ampliou de tal modo que ele obteve outros contratos suspeitos na Prefeitura e alocou pessoas de confiança na estrutura de comunicação do município.

Ele mudou o nome de sua empresa de captação de patrocínio para ATG Comunicação, abriu outras e, de tão rico, passou a investir em cavalos de raça, por meio do haras Guariroba. Tanta prosperidade às custas da Prefeitura não deve terminar tão cedo. O prefeito Bruno Reis, sucessor de ACM Neto, que pertence ao mesmo grupo, garantiu na semana passada: o modelo Alexandre Augusto de "captação" já está em curso para o Carnaval de 2023. Para o amigo de ACM Neto, a folia não tem fim.

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