O método Itaú

Redação
Publicada em 07/12/2024 às 23:20
Roberto Setubal (à esq.) e Pedro Moreira Salles estão à frente da postura agressiva do Itaú Foto: Eduardo Knapp/Folhapress

Os movimentos recentes do Itaú contra dois de seus principais executivos provocaram surpresa na opinião pública, apreensão entre funcionários do banco e dúvidas na Faria Lima. Se procederem, as informações divulgadas pelo Itaú para agir em ambos os casos apontam desvios graves de conduta. Contudo, ainda que o banco tenha razão quanto ao mérito das suspeitas e acusações, as versões oficiais do Itaú para tratorar os executivos desafiam a inteligência alheia. Nelas, abundam lacunas.

A se acreditar nas versões do Itaú, foi coincidência o banco, em menos de uma semana, demitir seu diretor de marketing e entrar com um processo pesado contra o diretor financeiro que saíra da companhia há poucos meses. Em ambos os casos, o Itaú afirma que existiram falhas éticas. Nos dois, houve exposição intensa dos executivos. Ambos foram queimados publicamente, sem que as circunstâncias dos respectivos casos fossem devidamente esclarecidas.

O método, o timing e a transparência parcial suscitaram dúvidas entre executivos da Faria Lima sobre o objetivo estratégico dos movimentos. Trata-se de uma simples coincidência, de um surto de compliance rigoroso no banco? Ou haveria alguma agenda oculta que demandaria a neutralização dos executivos - ou de, ao menos, um deles?

Num mercado que vive de precificar riscos e interpretar sinais, as ações do Itaú, o maior banco privado do Brasil, uma instituição que está cada vez mais colossal, mexem com as expectativas dos agentes financeiros. As especulações intensas decorrem da falta de informações precisas e completas por parte do Itaú. A consequência são ruídos - inclusive internamente.

Primeiro, o Itaú queimou Eduardo Tracanella, o Traca, diretor de marketing do banco, que estava na companhia há 27 anos. O banco se limitou a comunicar que Traca foi demitido por "mau uso do cartão de crédito corporativo". Ele era responsável por um dos maiores orçamentos de publicidade do país. Acreditou na justificativa do Itaú quem quis. Pouca gente quis, dentro ou fora do banco. A maioria só fingiu.

Ontem (na sexta), sobreveio um movimento ainda mais agressivo. Em assembleia e, logo depois, em ação judicial impetrada na Justiça de São Paulo, o Itaú foi com tudo para cima de Alexsandro Broedel, executivo do banco por 12 anos - nos últimos três, era CFO. Em julho, Broedel deixou o Itaú para assumir um cargo altamente estratégico na sede global do Santander, na Espanha. Supervisiona a contabilidade mundial da instituição.

O Itaú acusou o executivo de receber 4,8 milhões de reais em rebates de contratos firmados por ele próprio como CFO do banco. O esquema envolveria como intermediário o professor da USP Eliseu Martins, um dos maiores especialistas em contabilidade do país, que presta serviços ao Itaú há décadas. Na peça apresentada à Justiça, o Itaú, em essência, afirma que os dois, colegas de docência na USP, associaram-se para desviar dinheiro do banco.

As acusações são gravíssimas e instantaneamente pulverizaram as reputações de Broedel e de Eliseu Martins. As defesas de ambos negaram com contundência as acusações. Por meio de nota, Broedel disse que "causa profunda estranheza" o Itaú levantar as suspeitas após ele assumir posição de destaque no Santander. Afirmou que o banco sabia das contratações e que não há nada de errado nelas. Prometeu tomar as medidas judiciais cabíveis.

Eliseu Martins mostrou-se indignado. Lembrou que trabalha há quase cinco décadas para o Itaú e condenou a "má-fé" nas ações do banco e na interpretação dos fatos. Indicou que o Itaú o usou para atingir Broedel. Afirmou que prestou todos os serviços contratados pelo Itaú e que sua relação financeira com Broedel é normal.

Além de colegas na USP, Broedel e Eliseu Martins são formalmente sócios há anos. Apesar de essa informação constar na Junta Comercial de São Paulo e em qualquer banco de dados usado na área de compliance, o Itaú disse, na Justiça, que Broedel não declinou esse fato ao banco nos últimos anos - algo que o executivo contesta.

Segundo a cronologia registrada pelo banco na Justiça, o Itaú não sabia de qualquer irregularidade na conduta de Broedel - nem mesmo da sociedade com Eliseu Martins - até ele aceitar a proposta do Santander. Novamente, a se acreditar na versão do Itaú, o banco só tomou conhecimento das suspeitas depois da saída de Broedel, por acaso. O banco diz que, no final de julho, "recebeu informação" de que Broedel atuava como consultor e parecerista no mercado. Não diz de quem partiu a tal informação.

O banco afirma que passou a investigar a conduta de Broedel. Aqui, há outro fato que causa surpresa: o Itaú devassou as contas bancárias do executivo e de pessoas associadas ao caso. Não há qualquer menção à autorização judicial para quebrar o sigilo bancário do ex-executivo. Embora uma investigação interna tenha amplos poderes para aferir possíveis malfeitos, é duvidoso que ela tenha legitimidade para ir tão longe.

Por fim, o Itaú optou por formalizar, publicamente e com estrépito, uma acusação contra o ex-CFO. Por um lado, pode-se interpretar a medida como uma demonstração do compromisso do banco com a ética e com uma governança forte. É certamente o que o Itaú tenta projetar.

Por outro, porém, pode-se enxergar os anúncios públicos como, eles próprios, uma infração ética, ao exporem os suspeitos sem o devido processo legal - e com repercussões devastadoras para as vidas profissionais deles. No caso do ex-CFO e do professor Eliseu Martins, o Itaú imputa crimes a eles: menciona, inclusive, "vantagens indevidas recebidas" por Broedel, numa clara referência à corrupção.

A linguagem forte do Itaú contra os executivos se justapõe a uma governança frágil, a se acreditar, como sempre, na versão do banco. A sociedade entre Broedel e Eliseu Martins é pública desde 2012. No entanto, o Itaú só descobriu que seu CFO tinha essa empresa semanas após ele optar pela concorrência? E por "acaso"?

São esses tipos de dúvidas e perguntas, todas um tanto elementares diante dos fatos conhecidos, que causam o ruído cada vez mais intenso sobre os motivos por trás dos movimentos do Itaú. Se outras razões não há, talvez o banco pudesse apresentar explicações mais claras, diretas e completas ao público e a seus colaboradores.

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