Seis anos de pouco trabalho
A Polícia Federal levou seis anos para apresentar ao Supremo um relatório final tecnicamente frágil contra os senadores Renan Calheiros e Eduardo Braga e o ex-senador Romero Jucá. O trio foi investigado pela PF por suspeita de receber propina para favorecer a Hypermarcas. Agora, caberá à Procuradoria-Geral da República avaliar se denuncia os dois parlamentares, se pede mais informações à PF ou se arquiva o inquérito. O caso de Jucá foi enviado para a primeira instância da Justiça Federal e será conduzido pelo Ministério Público Federal.
A PF diz que o trio cometeu os crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e organização criminosa. As informações, às quais o Bastidor teve acesso, foram divulgadas na manhã desta sexta-feira (20) pelo UOL.
O inquérito da PF alicerçou-se na delação premiada de ex-diretores da Hypermarcas, atual Hypera Pharma. Um deles é Nelson José de Mello. Ele teve que repactuar sua delação após ser acusado de omitir informações para privilegiar a companhia, principalmente o acionista majoritário, João Alves de Queiroz Filho. Esse fato obrigou outros executivos da empresa a confessar crimes às autoridades.
Mello disse na delação que chegou até os senadores graças a Milton Lyra, operador do MDB. O ex-executivo relata que a proximidade com o lobista lhe garantiu acesso ao trio e também ao ex-presidente do Senado Eunício de Oliveira. Em troca, afirmou às autoridades, recebeu pedidos de Lyra para ajudar as campanhas desses políticos.
Segundo a PF, entre 2012 e 2015, a empresa farmacêutica pagou mais de 20 milhões de reais ao trio de políticos por meio de empresas de fachada que pertenciam a Milton Lyra. A PF diz ter corroborado os relatos de Mello com pagamentos feitos pela Hypermarcas em contratos fictícios.
Mas o inquérito apresentado em 22 de agosto a Edson Fachin, relator do caso no STF, contém apenas uma lista com nomes de empresas e pessoas supostamente contratadas pela empresa farmacêutica para prestação de serviços. A PF justifica ainda a conclusão sobre os crimes em razão de "e-mails, mensagens e documentos que evidenciam a proximidade" do trio com Milton Lyra.
Algumas das empresas listadas pertecem a Lyra. Há também registros de pagamentos ao Calazans de Freitas Advogados Associados, que pertence ao advogado Flávio Calazans. Ele também delatou e confirmou não ter prestado qualquer serviço pelos valores recebidos da Hypermarcas - alguns deles repassados posteriormente a empresas de Milton Lyra.
Um dos relatos de Mello envolve uma doação de 2 milhões em 2012 para quitar "dívidas de campanhas eleitorais anteriores passadas dos senadores Renan Calheiros, Romero Jucá, Eunício Oliveira e Eduardo Braga”. Noutro, o ex-executivo da Hypermarcas disse ter pago propina em 2014 a Renan, Braga e Eunício para emplacar Fernando Mendes como diretor da Anvisa.
O terceiro relato de Mello envolve episódio em 2015. Ele disse ter pago propina a Renan, Braga e Jucá pela aprovação de um projeto que concedeu benefícios fiscais favoráveis a Hypermarcas.
Apesar dos relatos condensados no indiciamento, não há qualquer menção da PF sobre quebras de sigilo fiscais e bancários dos citados. Os policiais também não conseguem comprovar o elo entre o pagamento das propinas e a aprovação da lei que criou benesses fiscais favoráveis a Hypermarcas.
Outro ponto que carece de confirmação é o recebimento do dinheiro por Renan, Jucá e Braga. Há menções, em relatórios da PGR, a mensagens solicitando dinheiro e relatórios do Coaf comprovando as transações entre as empresas. Mas nada que mostre todo o caminho do dinheiro pago pela Hypermarcas.
Em resumo, o relatório final parece ter sido elaborado com informações já disponíveis em 2018. É como se a PF em nada tivesse avançado nos últimos anos.
Sem a quebra dos sigilos bancários e fiscais dos beneficiados, não é possível aferir se o dinheiro foi, de fato, repassado aos suspeitos. E, sem depoimentos independentes e outras evidências de corroboração, não há como avançar na imputação de corrupção passiva em relação aos atos de ofício (aprovação da lei e nomeação de um diretor da Anvisa).
Diante dos entendimentos sobre crimes de colarinho branco consolidados na PGR e no Supremo, é altamente improvável que o caso avance.
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