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Um incapaz de sucesso

Karen Couto
Publicada em 05/08/2024 às 14:20
Erton está interditado desde 2017. Mesmo assim, assinou contratos milionários com o governo do Piauí

Uma empresa de construção, cujo dono e administrador é um homem interditado judicialmente por problemas mentais, conquistou 201 milhões de reais em 14 contratos assinados somente neste ano com o governo do Piauí, chefiado por Rafael Fonteles, do PT.

A empresa chama-se Construtora Rosacon. Tem sede em Teresina e capital social de sete milhões de reais. Desde 2022, ela pertence integralmente a Erton Hermes Fontinelli Rêgo Jr. Erton tem 37 anos, chegou a cursar duas faculdades (sem concluir nenhuma) e foi interditado em 2017. Nas redes sociais, tem dificuldade de se comunicar. Segundo documentos da Junta Comercial do Piauí, ele ingressou na sociedade em 2018. Após Erton assumir formalmente o controle da Rosacon, em 2022, a assinatura digital dele foi usada para firmar contratos e aditivos da construtora.

A interdição aconteceu em 2017, por um pedido da mãe, Maria Celeste Marques de Souza Rêgo. Segundo a ação movida por Maria Celeste, Erton sofre de “transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso de múltiplas drogas e ao uso de outras substâncias psicoativas” e “outros transtornos depressivos recorrentes”.

Em audiência realizada em 13 de dezembro de 2017 (veja trecho abaixo), o próprio Erton reconheceu não ter condições de assumir os atos da vida civil. “Eu nunca tive habilidade para dar procedência em coisa alguma da minha vida”, disse, em depoimento. Ainda no mesmo testemunho, Erton ressaltou que sua mãe é a responsável por ele - pelos atos da sua vida.

Em decisão liminar, o juiz responsável pelo caso interditou Erton, e concedeu a curatela antecipada para a mãe. Ministério Público e Defensoria Pública concordaram com a decisão.

A interdição de direitos é uma intervenção judicial sobre uma pessoa que seja incapaz de tomar decisões sobre a própria vida. A partir da intervenção, o interditado passa a depender de um tutor (quando menor de idade) ou curador (maiores de 18 anos), ou seja, alguém que se responsabiliza por seus atos, e o representará quando necessário.

Pode ser declarada incapaz a pessoa que tem dificuldade de expressar sua vontade, de compreender suas decisões devido a algum transtorno mental, dependência química ou doença neurológica. Também pode ser concedida a interdição em caso de pessoas que não tenham controle sobre suas finanças, ao ponto de colocar os próprios bens em risco de falência.

Com a interdição, Erton ficou impedido de exercer todo e qualquer ato da vida civil, como gerir seu patrimônio financeiro, contrair casamento e assinar contratos. Erton ainda aguarda perícia para a concessão da curatela definitiva para a mãe. Como a perícia ainda não foi realizada, a decisão liminar segue valendo.

A capacidade da Construtora Rosacon

Conforme registros da Junta Comercial do Piauí, a Construtora Rosacon foi aberta, em 2015, por dois irmãos de Erton: Antônio Fillipe Marques Rêgo (como sócio-administrador) e Lana Thaysa Marques Rêgo. Tinha capital social de 50 mil reais. Sua principal atividade: “reparação de artigos do mobiliário".

Em 2018, Lana deixou a sociedade, transferindo suas cotas para Erton. Quatro anos depois, em 2022, foi a vez de Antônio Fillipe deixar a sociedade. Repassou todas as cotas para Erton, que se tornou o único sócio da empresa. Também virou, no papel, o administrador dela. Quando Erton assumiu a Rosacon, a empresa já estava com capital social de sete milhões de reais.

Desde que Erton tomou a frente dos negócios, a construtora não para de ganhar contratos com o governo do Piauí. A maior parte deles é para reparação e manutenção dos prédios da administração, vinculados à Secretaria de Educação do Piauí, Universidade Estadual, Secretaria de Meio Ambiente, Secretaria de Fazenda, Secretaria de Administração e até da Secretaria de Segurança Pública.

Neste ano, a Rosacon de Erton venceu até a licitação para a construção da sede do Departamento de Repressão às Ações Criminosas Organizadas (DRACO) e a construção do Batalhão de Choque da PM-PI.

Todos os 14 contratos ainda vigentes foram assinados digitalmente por Erton.

A reportagem do Bastidor também verificou os dados da construtora. O endereço indicado como sede da Rosacon não passa de um terreno cercado por um muro. Coincidentemente, fica ao lado da sede de uma outra empresa do irmão Antônio Fillipe, a “Modularte Construções”.

Nas redes sociais, Erton, os irmãos e a mãe dele exibem hábitos simples e um estilo de vida modesto, aparentemente incompatível com o sucesso financeiro extraordinário da Rosacon.

Na sexta, dia 2, o Bastidor entrou em contato com os envolvidos. Erton confirmou ser o dono da empresa e afirmou que “tudo está indo muito bem, graças a Deus”. Quando foi questionado sobre o processo de interdição, desligou e não respondeu mais.

Lana Thaysa também confirmou que foi sócia da empresa, mas que saiu, e que quem responde pela construtora é Erton. Ela também desligou após ser questionada sobre a incapacidade de Erton.

Também procurada, Maria Celeste, mãe de Erton, disse que é ela, na verdade, a proprietária da Rosacon. Disse que a ligação estava ruim, pediu tempo para responder e, como os demais, desligou.

O Bastidor não conseguiu contato com Antônio Fillipe.

Atualização às 12h30 de terça, dia 6:

O governo do Piauí informou que está averiguando as informações.

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